RIO - A memória serve como um elemento para a construção da identidade no cinema do diretor argentino Andrés di Tella. É uma memória que surge em documentários como "Montoneros, uma história", "Fotografias", "O país do diabo" ou "A televisão e eu", algumas de suas obras que estão em exibição em Rio e São Paulo no festival É Tudo Verdade. Pelo bom cinema que faz, Di Tella é o homenageado internacional desta 17ª edição do principal evento de documentários do país.
Com uma carreira iniciada no início dos anos 1990, o cineasta argentino é considerado um dos grandes de seu país, sobretudo na produção documental. Além disso, Di Tella foi o primeiro diretor artístico do prestigiado Festival Internacional de Cinema Independente de Buenos Aires (Bafici, na sigla em espanhol), uma mostra surgida em 1999, mais ou menos na época em que a produção audiovisual argentina passou por um boom criativo. O cineasta também é o diretor do Festival de Documentário de Princeton, nos EUA.
— Hoje em dia parece haver um festival por semana, mas quando começou o É Tudo Verdade não havia tantos, e ainda menos de documentários. Acho que devemos a esses festivais o gosto do público pelos documentários hoje — explica Di Tella. — Antes, o gênero era visto como uma coisa feita para a TV, com bichinhos. Quando a gente falava que fazia documentário, perguntavam sobre que animal estávamos tratando. Isso mudou. No Bafici, por exemplo, nós programamos os documentários nas mesmas mostras que os filmes de ficção. Isso fez com que público e críticos se acostumassem com o gênero.
Além de ajudar a popularizar o documentário na Argentina, o Bafici também foi fundamental para dar vazão à nova produção de cinema argentino surgida no fim do século passado.
— O festival coincidiu com esse renascimento, com filmes de Pablo Trapero, Martín Rejtman, Lucrecia Martel. A última década do cinema argentino foi uma idade de ouro — diz. — Mas, agora, a todo tempo os críticos escrevem que o novo cinema argentino morreu. Eu não concordo. O que morreu foi a expectativa. Não há surpresa. Não há mais o impacto que "Mundo grua", do Trapero, teve ao ser exibido no primeiro Bafici. Hoje, a realidade do cinema argentino é tão rica que se perdeu o elemento surpresa.
O próprio Di Tella fez parte da construção desta realidade. Seus documentários em geral partem de questionamentos pessoais para buscar uma comunicação com o público. "A televisão e eu", por exemplo, analisa a penetração do imaginário da TV na memória coletiva de uma sociedade. Já em "Fotografias", ele vai atrás da história de sua mãe, nascida na Índia, através de imagens. Tudo isso vai ser debatido no domingo, no Centro Cultural Banco do Brasil, num encontro do público com Di Tella, após a sessão de "Golpes de machado", marcada para as 18h30m.
— A memória representa a identidade. Lembra de "Blade Runner"? Quando eles criaram os Replicantes, a memória deles foi feita com quatro ou cinco fotos inseridas na lembrança, para que eles acreditassem que eram humanos. E é assim que acontece. A memória de um indivíduo é sua identidade. E por isso, a memória de uma comunidade é também é sua identidade.
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